enquanto eu não volto...

abandono o meu corpo devagar lamentando cada milésimo de segundo... alguém cuidará dele enquanto eu não volto?

sábado, abril 15, 2006

Desculpa... raiva sou eu que sinto.
Vergonha? Sim tenho vergonha. Devia era ficar quietinha e caladinha e tratar-te muito bem antes que te lembres de perceber que a nossa relação acabou e que me mandes embora da tua vida. Medo! É medo que eu devo ter. Não é lá muito esperto levantar ondas, pois não? Sim... também tenho medo, mas tenho mais raiva e é ela que me move agora. Raiva porque não me desejas. Raiva porque tens vergonha de mim. Porque de tanto desvalorizares as minhas coisas boas, elas mirraram e sumiram sábe-se lá para aonde. Estou vazia de coisas boas agora. Sou só gorda e inútil. A culpa? É minha que já devia saber que andar com alguém que não nos dá valor é devastador.

E agora tu!

Cada vez mais vejo no teu olhar... sei lá... não é bem desprezo, é algo que ultrapassa a desilusão... pena? Não sei o que é mas magoa-me cada vez mais. O que é que te leva a continuar comigo? Não são os risos, as conversas animadas, as brincadeiras... tens... temos feito um esforço para acabar com elas. Sei que não é desejo! Não me queres! Usas a tua erecção matinal (ou tiveste um sonho erótico?) para me tentares dar o que pensas que eu quero. O que é que pensas que eu quero? E eu dou-te o que penso que tu queres! O que é que querias?

Às vezes parece-me reconhecer vergonha em ti, vergonha de mim, claro. Vergonha da minha falta de determinação para conseguir o que quero. Vergonha por teres uma namorada cada vez mais gorda... uma gorda não tem lugar no teu mundo perfeito, uma inútil, fraca... o teu mundo dos fortes... o mundo de bem sucessidos.

Mas tenho uma coisinha para te dizer... VAI À MERDA! Não gostas não comas! Mas principalmente não me venhas comer contrariado e com raiva como se desses uma esmola aos arrumadores... Não vou aceitar continuar a andar contigo se tens vergonha de mim. Aceitar que não me dês valor é desvalorizar-me e é isso que eu tenho andado a fazer aos poucos. Agora chega.

Volta meia volta, volta-me...

Raiva! Uma raiva imensa porque me desejava tanto! Puta! Tinha vergonha de mim, ele... Escondía-me... só me confessava aos melhores amigos, aqueles capazes de lhe aceitar um deslize, uma fraqueza. Puritano? Sei lá... doente, acho. Indignáva-o a maneira descomplicada com que eu encarava a sexualidade. Nuvem negra, chamáva-me. Como se o hipnotizasse a seguir-me para o reino da trevas. Repudiáva-me quando eu demonstrava o meu desejo por ele. Agredía-me com a sua voz, com o seu olhar, com todos os espinhos que o seu corpo conseguia erguer. E picava muito. Não era consciente que me exibia o seu corpo perfeito, era o calor, enrolava as mangas da camisa e eu suava com o calor. Odiáva-me por deseja-lo antes de o amar. Eu? Eu não percebia nada. As suas mensagens contraditórias baralhávam-me e magoávam-me. Acho que agora percebo.

sábado, abril 08, 2006

Quero?

Lembro-me de correr. Correr! Depois lembro-me de nem andar querer. Anos e anos passaram sem que eu quizesse andar e era feliz ou achava que era. Não sei... o que é ser feliz senão a sensação que se o é? Eu julgava-me feliz! Era feliz quando corria. Era feliz quando não queria andar. Agora quero. Preciso! É uma imposição agora minha... Costumava indignar as pessoas por não ter vontade de andar, por estar sempre sentada. Isso incomodáva-me. Gostava que olhassem para mim com admiração. Aos poucos fui adoptando essa meta como minha. Estar sentada agora já não é prazer, é culpa. Tenho de andar. Quero tanto... preciso tanto! Andar, e sem muletas, que ninguém iria admirar-me enquanto me deslocasse deselegante apoiada nas muletas, arrastando a perna que me resta num equilíbrio triste...

Pois é... falta-me uma perna! Cada nova prótese que tento é uma nova esperança. Sei que o caminho vai ser duro mas encaro esse sofrimento com alegria porque no fim vou poder andar novamente como tu. Cada nova prótese tem um período de adaptação. Cada nova prótese tem um período de negação. Um período de incerteza. E por fim a rejeição absoluta. Cada nova prótese rouba-me um pouquinho de vida e cada vez me custa mais entusiasmar-me com uma nova prótese. Resta-me esperar que a perna me cresça de volta!

Glossário:

Andar - trabalhar (acabar o trabalho final e ingressar no mercado de trabalho)
Correr - trabalhar determinada e satisfeita (na altura trabalhar era cumprir as minhas tarefas de miúda da escola, fazer os tpcs, estudar para os testes, ter boas notas, ser bem educada com os professores, etc)
Estar sentada - estar de férias, fins-de-semana, feriados, tempos livres, viajar, brincar...
Muletas - rendimentos que vou recebendo sem fazer patavina, excepto tratar, de vez em quando, dumas tretas duns papeis, assinaturas, contractos, aturar os loucos dos meus tios, e afins e mesmos assim o pincel maior é o meu irmão que resolve
Perna - objectivos e motivação, saber o que quero (eu quando for grande quero ser...)
Próteses - motivações inventadas (já sei o que quero... é fazer massagens, é trabalhar num viveiro de plantas, é dedicar-me à agricultura, é ser arquitecta paisagista, é nem pensar ser arquitecta paisagista, é ser empregada de balcão, é ser instrutora de snowboard, é ter uma empresa de caminhadas, é trabalhar para uma empresa de caminhadas, é... é...)

quarta-feira, abril 05, 2006

Upgrade


Quem viu...

terça-feira, abril 04, 2006

Ainda os meus sonhos

Quem sou eu?

Um sonho verosímel. Uma vida paralela. Outra dimensão. O mesmo eu?

Delinquente, toxicodependente... envolvida num homicídio acidental que, por não me conseguir ver livre do corpo, me obrigou a fugir. Assustada descia a minha rua a correr. Não poderia voltar. Não tinha para onde ir, não tinha dinheiro. Do portão dos meus vizinho sai um miúdo pequeno. "Tia, tia, dá-me um abraço!". Comovida peguei-o ao colo e abracei-o com força. Num milésimo de segundo vi naquela criança a esperança duma saída... Desatei a correr com ele ao colo. Raptei-o!

Tive de ir pedir esmola para arranjar qualquer coisa para lhe dar de comer. Não lhe queria fazer mal, já bastava tê-lo separado da família...

Numa ruela ao pé da Igreja um sem abrigo guardava altivo o seu reino de tralha. Pedi-lhe leite mas só tinha licor para me oferecer. Pedi-lhe um retalho duma manta para aquecer o miúdo mas não consegui nada.

Ao virar da esquina uma esplanada de café estendia-se ao longo da parede. Aproximei-me da primeira mesa e dirigi-me a uma senhora velhota com um ar bem disposto. "Minha senhora, por favor, preciso de dar comida à minha filha, não me pode ajudar..." (não queria que me relacionassem com o rapto por isso inventei uma filha). A senhora olhou para mim triste. Agarrou-me na mão e lamentou a minha vida mas negou-me o dinheiro para comprar comida. Tentei convencê-la contando que tinha acabado de recusar uma garrafa de licor que me tinham oferecido, queria que percebesse que a aflição de não ter comida para dar à minha filha era mais forte que os meus vícios mas a senhora continuou a recusar ajudar.

Tinha de devolver o miúdo. Não tinha como dar-lhe comida, como agasa-lhá-lo, como acalmar os seus medos no meu mundo negro. Imaginei várias vezes que tocava à campaínha e que a chorar arrependida o soltava dos meus braços desesperados para os braços desesperados da sua mãe.

O sonho acabou. Ficou a dúvida. Os sentimentos eram os meus. Uma vida paralela. Noutra dimensão eu vivo agarrada a outras escolhas. Às escolhas erradas.

segunda-feira, abril 03, 2006

O padrão do vestido das ovelhinhas (cont)















... e como prometido é devido...
cá vai!