enquanto eu não volto...

abandono o meu corpo devagar lamentando cada milésimo de segundo... alguém cuidará dele enquanto eu não volto?

terça-feira, abril 04, 2006

Ainda os meus sonhos

Quem sou eu?

Um sonho verosímel. Uma vida paralela. Outra dimensão. O mesmo eu?

Delinquente, toxicodependente... envolvida num homicídio acidental que, por não me conseguir ver livre do corpo, me obrigou a fugir. Assustada descia a minha rua a correr. Não poderia voltar. Não tinha para onde ir, não tinha dinheiro. Do portão dos meus vizinho sai um miúdo pequeno. "Tia, tia, dá-me um abraço!". Comovida peguei-o ao colo e abracei-o com força. Num milésimo de segundo vi naquela criança a esperança duma saída... Desatei a correr com ele ao colo. Raptei-o!

Tive de ir pedir esmola para arranjar qualquer coisa para lhe dar de comer. Não lhe queria fazer mal, já bastava tê-lo separado da família...

Numa ruela ao pé da Igreja um sem abrigo guardava altivo o seu reino de tralha. Pedi-lhe leite mas só tinha licor para me oferecer. Pedi-lhe um retalho duma manta para aquecer o miúdo mas não consegui nada.

Ao virar da esquina uma esplanada de café estendia-se ao longo da parede. Aproximei-me da primeira mesa e dirigi-me a uma senhora velhota com um ar bem disposto. "Minha senhora, por favor, preciso de dar comida à minha filha, não me pode ajudar..." (não queria que me relacionassem com o rapto por isso inventei uma filha). A senhora olhou para mim triste. Agarrou-me na mão e lamentou a minha vida mas negou-me o dinheiro para comprar comida. Tentei convencê-la contando que tinha acabado de recusar uma garrafa de licor que me tinham oferecido, queria que percebesse que a aflição de não ter comida para dar à minha filha era mais forte que os meus vícios mas a senhora continuou a recusar ajudar.

Tinha de devolver o miúdo. Não tinha como dar-lhe comida, como agasa-lhá-lo, como acalmar os seus medos no meu mundo negro. Imaginei várias vezes que tocava à campaínha e que a chorar arrependida o soltava dos meus braços desesperados para os braços desesperados da sua mãe.

O sonho acabou. Ficou a dúvida. Os sentimentos eram os meus. Uma vida paralela. Noutra dimensão eu vivo agarrada a outras escolhas. Às escolhas erradas.

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